domingo, 22 de junho de 2014

Rebenta a bolha, por Alexandre Abreu

Rebenta a bolha

Está a formar-se uma gigantesca bolha especulativa à frente dos nossos olhos.
Quando rebentar, a grande recessão iniciada em 2007 vai entrar na sua segunda fase aguda.
E as regras do jogo vão novamente mudar. 


| Expresso

Vivemos em tempos financeiros, como diz um slogan recente do Financial Times.
É verdade.
Nunca a finança teve tanto peso e tanta influência como nos dias que correm.
É um resultado, sobretudo, do efeito de três factores principais ao longo das três últimas décadas: a evolução tecnológica, principalmente ao nível das tecnologias de informação; a desregulação dos mercados e transacções financeiras, com destaque para a abolição dos controlos de capitais associados ao sistema de Bretton Woods da década de 1970 em diante; e as próprias características intrínsecas do regime de acumulação neoliberal, no qual a desigualdade crescente constrange a procura de bens e serviços ao mesmo tempo que alimenta a expansão dos mercados financeiros.
A mitologia habitual da finança apresenta estes desenvolvimentos como positivos para a actividade económica, na medida em que possibilitam uma afectação pretensamente óptima do risco e dos recursos.
A realidade, claro, é muito diferente, tendo mais a ver com aquilo que o próprio Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal norte-americana, designou certa vez por "exuberância irracional" - a tendência intrínseca para a formação dos preços nos mercados financeiros ser conduzida por heurísticas não-racionais e comportamentos de rebanho, especialmente evidentes aquando da formação e eclosão de bolhas especulativas.
Da crise asiática do final dos anos '90 à crise do dot.com no início dos anos 2000 ou à crise financeira internacional de 2007-08, o padrão é sempre o mesmo: afluxo do capital financeiro a um determinado mercado, conjunto de activos ou espaço regional; valorização desses activos muito acima do que os respectivos fundamentos económicos justificariam; pânico despoletado por algum factor mais ou menos acidental; deflação da bolha especulativa.
Seguem-se então os mecanismos de transmissão à economia real: a rápida desvalorização dos activos provoca a deterioração da situação patrimonial de muitos agentes, o que provoca o adiamento de decisões de consumo e investimento, ao mesmo tempo que o aumento da percepção do risco tende a paralizar, pelo menos temporariamente, a concessão de crédito - e todos estes processos produzem efeitos em cadeia, que incluem numerosas falências e despedimentos em massa.

As bolhas formam-se de forma incremental e discreta, mas rebentam de forma súbita, descoordenada e espetacular.
Estas crises emergem na esfera financeira e transmitem-se à esfera real, mas vale a pena sublinhar que, em última análise, têm a sua origem na própria economia real.
Porquê?
A um primeiro nível, mais simples, porque as próprias limitações à rendibilidade do investimento produtivo na esfera real provocam o afluxo de capital à esfera financeira, alimentando a formação das bolhas especulativas.
Mas a um segundo nível, mais fundamental, devido ao facto da esfera financeira mais não fazer do que redistribuir o valor que é criado na economia real.
Os mercados financeiros não produzem e não podem produzir nada - é a esfera real da economia que o faz.

A exuberância dos mercados financeiros está sempre limitada, em última instância, pela base real na qual assentam e da qual extraem a riqueza que redistribuem.
E se procedo a toda esta introdução, é para que os leitores se encontrem em melhores condições para analisarem por si próprios todas as implicações de um processo que se tem vindo a passar ao longo dos últimos anos, incremental e discretamente mas debaixo dos nossos olhos: um gigantesco e crescente desfasamento entre a capitalização bolsista nas generalidade das economias avançadas e a estagnação da esfera real nessas mesmas economias.

Nos Estados Unidos, o indicador que reflecte de forma mais directa esta relação (o rácio entre a capitalização bolsista e o PIB, popularizado nos meios financeiros como o "indicador Warren Buffett") aumentou de 60% em 1996 para 150% em 2000, antes de cair novamente para 60% aquando da crise do dot.com.
Em seguida, subiu gradualmente até mais de 110% em 2007, para voltar a cair para pouco mais de 50% aquando da crise financeira de 2007-08.
E neste momento está novamente perto de 120%, tendo mais do que duplicado desde o ponto mais baixo atingido em 2008.
Se fizermos o mesmo exercício para outros contextos e índices bolsistas (FTSE-100, CAC-40 ou DAX-30, por exemplo), encontramos um panorama semelhante: enormes aumentos da capitalização bolsista nos anos mais recentes, impossíveis de justificar com base no (inexistente) dinamismo da esfera produtiva real.
Ora, se isto não é uma gigantesca bolha especulativa à espera de rebentar, não sei o que será.
Quando isso suceder, teremos uma nova crise financeira global - e quando esta se transmitir à esfera real, entraremos na segunda fase aguda da grande recessão iniciada em 2007, após alguns anos de estagnação como interlúdio.

Desta vez, será impossível ao sector público absorver parte do choque da mesma maneira: a política monetária, inclusive não-convencional, já não tem instrumentos à disposição; e a margem para aumentar o endividamento público é agora muito mais reduzida.
Para o bem ou para o mal, as regras do jogo vão voltar a mudar.
 


sábado, 14 de junho de 2014

Prémio mundial distingue Duarte Nuno Vieira no campo das ciências forenses, por Catarina Gomes

Publicado em , por Catarina Gomes, no "Jornal Médico.pt"

Vieira, Duarte Nuno

O catedrático Duarte Nuno Vieira, ex-presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, foi distinguido com o prémio mundial Douglas Lucas Medal 2014, anunciou hoje a Universidade de Coimbra (UC).
 
Tratando-se da “mais alta distinção” no domínio das ciências forenses, o prémio vai ser entregue a Duarte Nuno Vieira durante o “20th World Meeting of the International Association of Forensic Sciences”, que decorrerá em Seul, na Coreia do Sul, em Outubro, segundo uma nota da Reitoria da UC.
 
Criado em 1999 pela Academia Americana de Ciências Forenses, o Prémio Douglas Lucas Medal é atribuído, de três em três anos, “a um especialista forense que se tenha destacado particularmente pela contribuição dada para o desenvolvimento das ciências forenses a nível internacional”, adianta.
 
Na sua decisão, aprovada por unanimidade, o júri realçou “o valioso trabalho desenvolvido pelo galardoado em diversos domínios das ciências forenses – e muito particularmente no âmbito da patologia e clínica forense – especialmente na defesa dos direitos humanos, bem como na organização de serviços médico-legais e forenses em vários países do mundo, e o forte impacto que o trabalho que concretizou até hoje teve na comunidade forense internacional”.
 
Citado na nota, Duarte Nuno Vieira, professor da Faculdade de Medicina de Coimbra, recebeu com “enorme surpresa e profunda emoção” a notícia da sua distinção “por um júri constituído pelos mais reputados e reconhecidos cientistas forenses internacionais”.
 
Entre os galardoados com o Prémio Douglas Lucas Medal, contam-se o britânico Alec Jeffreys (que descobriu a utilização do ADN para fins forenses), o norte-americano Clyde Snow (criador da antropologia forense e da sua aplicação aos direitos humanos) e o suíço Pierre Margot (considerado “a maior autoridade mundial no domínio da criminologia”).